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Resposta aos comentários que recebi

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Por favor, leia-a na íntegra

No dia 02 de maio de 2016, redigi um artigo comentando a chamada “consagração a Maria: escravos por amor”, uma proposta antiga, desde os primeiros séculos do cristianismo, mas que ganhou força, sobretudo, a partir da obra de São Luiz G. de Montfort: “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”.

Poucas vezes vi um artigo meu ser tão comentado e difundido como esse. Ao redigi-lo tive como única intenção: refletir, questionar, argumentar e ponderar atitudes de muitos dos que se consagram a Maria por esse método e dar o meu parecer sobre esta realidade.

Recebi, como já esperava, muitas críticas. Algumas carregadas de sinceridade, profundas, honestas, lúcidas e sensatas. Mas a grande maioria foi ácida, ao ponto de muitas serem impublicáveis. Outras, eu as deixei como foram postadas, especialmente nas redes sociais. Grande parte dos que me criticaram foram jovens, como também já esperava. De algum modo, tais críticas confirmaram minhas desconfianças.

Este segundo texto, que não é um artigo, mas uma resposta aos muitos comentários que recebi, fez-se necessário uma vez que a maioria das críticas não condiz com a realidade e, por isso, não comporta a verdade. Tentarei ser o mais sucinto possível.

Fui acusado por muitos de estar a serviço do demônio, por criticar e ser contra Maria e a obra de São Luiz G. de Montfort.

Primeiramente, quero dizer que Maria sempre esteve em minha vida. Ainda criança aprendi a rezar a Ela aos pés de minha mãe, hoje uma senhora de quase 80 anos e que reza, diariamente, mais de três terços e é uma mulher profundamente humana e de uma bondade que “invejo”. Rezávamos constantemente o terço em família. Na minha adolescência íamos de casa em casa ensinando outros a rezá-lo. Quem me conhece desde esse tempo sabe que digo a verdade. Antes de entrar no seminário, consagrei minha vocação a Maria. Em minha ordenação presbiteral, meu bispo consagrou-me junto com minha mãe a Nossa Senhora. Hoje, como padre, rezo o terço todos os dias e trabalho em um Santuário Mariano. Não sou apenas devoto de Maria. Sou filho e tenho por ela um carinho, respeito, reverência e intimidade que duvido que muitos tenham.

Acusaram-me ainda de desconhecer o “Tratado”. Não é verdade. Eu o ganhei no meu 20º aniversário de uma amiga muito devota de Nossa Senhora. Li, reli e o tenho todo rabiscado. Não sou ignorante no que afirmo. Amo e respeito os santos e os tenho na conta de amigos. Sei que São Luiz, em seu tempo e no lugar em que estava, teve uma intenção louvável ao redigi-lo. Isso é inquestionável. Todavia, como cristão católico, sei que um único livro temos como inspirado: a Bíblia. E mesmo ela precisa ser interpretada, contextualizada, estudada e compreendida no todo. Do contrário, arvoram-se as literalidades que cortejam com o fundamentalismo, o extremismo e o anacronismo do texto. Sem o mínimo de contexto, o texto é pretexto para os meus preconceitos.

Questionaram-me acerca dos muitos santos que o “Tratado” deu à Igreja. Uma quantidade enorme de gente lotou minha timeline de documentos pontifícios numa verborragia sem fim. Acredito na sinceridade dos papas e dos bispos que a louvaram e até fizeram-na. Mas, sinceramente, duvido que muitos ali tenham lido aqueles escritos, como duvido que a maioria dos que me criticaram, injustamente, tenham se dado o trabalho de ler o meu artigo na íntegra, até mesmo porque ele é longo, admito. São seis (06) páginas. Em muitos comentários é notório o “copia e cola”. Por serem de grupos afins, alguns simplesmente tomaram as dores dos amigos e enxovalharam-me sem ao menos fazerem perguntas mínimas e honestas ao próprio artigo. Pessoas do norte, do sudeste e até do sul do Brasil me recriminaram e disseram que vão rezar por minha conversão. Agradeci. Preciso mesmo me converter. Quanto a isso, de coração, agradeço. Não tenho a presunção de achar que já estou pronto. Mas me escandalizou um pouco a falta de compostura de alguns em relação a um padre. Cresci amando e respeitando os padres. Tenho por eles uma reverência sincera. Mas procurei entender. Na faculdade – sim, eu ainda estudo – temos nos debruçado sobre os perfis das gerações. A de agora é a Geração Y. Mas sobre isso será tema de um artigo futuro. Quem tiver interesse, dê uma olhada no google. Entender os tempos atuais ajuda a não nos desesperarmos.

Quando adolescente, e indo de casa em casa rezando o terço, eu pensava: se uma pessoa reza o terço, então está tudo certo. Afinal, na escola de Maria aprende-se sobre o Cristo, adere-se a Ele e vive-se o amor, a partilha, e o devoto vai se tornando, paulatinamente, cada vez mais humano. Sim, porque é para isso que serve a fé: para nos tornar mais humanos. Afinal, só quando formos plenamente humanos é que poderemos ser divinos. Isso é dado de fé irrefutável. Deus quis ser gente para demonstrar-nos a grandiosidade de nossa vocação humana. Disso não deveríamos ter dúvidas. Ledo engano. Outros me acusam de ser protestante. Por quê? Por eu saber o lugar de Maria no plano da salvação, na Igreja e em minha vida?

Então, qual é o cerne de minha questão com aquele artigo?

A prática devocional deve ter um fim para além de si mesma. Ela deve ser teleológica. A devoção da “escravidão” nos moldes em que está, em que se apresenta ao menos em nossa região, e como é vivida por muitos com os quais já entrei em contato, é um equívoco. Está permeada de fanatismo, de extremismos, de incoerências cristãs, de exageros que comprometem inclusive a sanidade das pessoas. Há muitos adoecidos intelectual, psíquica, emocional, afetiva e espiritualmente. Muitos. Não todos. Não digo por ouvir dizer. Digo com conhecimento de causa. Não ouso dizer mais, pois sou impedido pela ética.

Outro grande infortúnio que vejo na prática dessa devoção é que muitos – muitos – dos que aderem a ela se sentem como que numa “casta de privilegiados”, considerando-se mais santos e mais tementes a Deus do que outrem. Vivem e se comportam com uma arrogância inconciliável com a prática cristã. São homens e mulheres, jovens e idosos, profissionais liberais, executivos e empresários que se consideram melhores em matéria de vivência e conhecimento da fé. Desconsideram que a maior e melhor consagração é o Batismo que nos torna todos filhos de Deus e, portanto, irmãos. “Para vós sou bispo, convosco sou cristão. A primeira é a minha obrigação, a segunda a minha dignidade” (Santo Agostinho). Nenhuma outra “consagração” sobrepõe-se a essa.

Portanto, sinto-me gabaritado a dizer com toda coragem e autoridade que o meu ministério me confere: a “consagração a Maria” sob o viés acima apresentado é uma falácia, um grave erro teológico-cristão e um grande desserviço à Fé. Aconselho, vivamente, aos pais e educadores que orientem seus filhos e educandos a ponderarem, a refletirem e a reconsiderarem a adesão a essa “consagração”. Aos colegas de ministério ouso dizer: acompanhem de perto aqueles que querem fazer tal “consagração”, instrua-os e evitem “acolhê-los” em suas Paróquias antes de terem uma confirmação da idoneidade e sinceridade de seus corações.

Aos jovens, por fim, irmãos na fé que amo e respeito, oriento: há devoções autênticas em nossa Igreja que podem ajudá-los a viver prontamente o desejo de seus corações por uma vida sempre mais coerente com o Evangelho. Prefira-as. Há grupos e movimentos, Pastorais, sobretudo, que darão a vocês aquele sentido pelo qual suas vidas tanto anseiam. Duvidem de fórmulas prontas, de propostas mágicas, desconexas da vida e que desconsiderem o humano que há em vocês. Se algo ferir vossa humanidade, com pedantismos e fardos insolúveis, fujam dele. Se a prática de uma espiritualidade não os tornar mais humanos, tolerantes, abertos ao diferente, solícitos com a Igreja e com os irmãos mais necessitados, não adiram. É enganoso. Se os vossos mestres de hoje não se parecerem com o Mestre de Nazaré, são falsos.

Alguns, ao me criticarem acidamente, concluíam pedindo-me a benção. Quero crer que foram honestos. Portanto, Deus os abençoe.

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Por, Pe. Claudemar Pereira da Silva
www.padreclaudemarsilva.com

“O que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos” I Jo 1, 3.


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