Chegamos ao presídio “Jacy de Assis” pontualmente às 09h, conforme o horário agendado. Fomos recebidos por um dos diretores que nos levou à sala de comando. Ali, ficamos sabendo para qual ala iríamos para o momento de oração e encontro com os presidiários. Após a definição pelos responsáveis, seguimos pelo interior do presídio, acompanhados por um policial. O trajeto pareceu-me longo, mas bem cuidado. Embora eu já tivesse ido a um presídio na época da minha pós em comunicação – quando visitamos um presídio e um prostíbulo que me impactaram profundamente a ponto de eu me perguntar em qual dos dois havia maior “atentado” à dignidade humana -, era a minha primeira vez no Jacy de Assis.
Na noite anterior não havia dormido bem: como irão nos receber? Como será o momento de oração? Essas questões povoaram minha mente. Mas uma certeza me encorajava: estamos no Ano da Misericórdia. Será a expressão concreta da Igreja Diocesana no cumprimento ao mandamento do Senhor: “estive preso e foste me visitar” (Mt 25, 35). Éramos mais de duas pessoas e onde “duas ou mais estiverem em meu nome”, disse Jesus, “eu estarei no meio delas” (Mt 18,20), e, além do mais, estávamos com a presença do bispo diocesano e “onde está o bispo, aí está a Igreja” (Santo Inácio de Antioquia). Não levamos aparelho de som nem instrumentos musicais. O único amplificador foi a voz: em alto e bom som. O momento de oração transcorreu na mais absoluta paz. “Das visitas que já fiz, esta foi a mais tranquila”, confessou-nos depois o bispo. Utilizamos um roteiro preparado pela Pastoral Carcerária. Um dos agentes da Pastoral da Diocese estava conosco: Sr. João Cezário.
Durante a oração, de mãos dadas, rezamos juntos com os presos a oração do pai-nosso. Depois, eu e o bispo diocesano através das aberturas das grades impomos as mãos sobre cada detento, rezando por eles. Fomos ainda em cada uma das celas, dispostas naquela ala, cumprimentando os que não saíram para o banho de sol. Alguns nos pediram oração e outros diziam nomes de familiares para que rezássemos por eles. Foi um momento de “olho no olho”, apertos de mãos demorados e a pergunta pelo nome: “qual o seu nome, meu irmão?”. Afinal, não há nada mais respeitoso do que “devolver ao outro” o seu direito de ser nomeado, sobretudo num lugar onde o mais fácil é tornar-se esquecido, diluído entre os demais.
Ficamos um pouco mais de duas horas no presídio. E antes de sairmos, fomos à enfermaria onde alguns presos doentes eram medicados ou estavam internados. Colocamo-nos junto às grades e ouvimos suas histórias, suas queixas e suas aspirações. Depois, de mãos dadas, rezamos o pai-nosso. Já no pátio de saída, enquanto aguardávamos os protocolos necessários, eu me sentei num banco onde uma detenta, da ala feminina, aguardava uma policial. Eu pedi licença para sentar-me ao seu lado. Ela, sem me encarar, consentiu com a cabeça. Quis dirigir-lhe a palavra, mas meus pensamentos foram mais rápidos do que minha fala e, de voz embargada, silenciei. À essa altura eu já me perguntava: será que tem filhos? Esposo? Pais? Que dores e sonhos ela traz?
Às 11h15 entramos no carro. Olhei pela janela e vi alguns familiares que, no portão de entrada, aguardavam a vez de visitarem seus entes-queridos. A maioria era mulher, como é de praxe em contextos assim. Quase não havia homens. Elas são mais generosas e não se esquecem de seus filhos, esposos, pais, irmãos, amigos. Fiz uma prece em silêncio por elas enquanto cruzávamos o umbral da saída. O Cristo, preso com aqueles homens, tinha recebido a nossa visita. Ele, no entanto, seguia conosco enquanto nossos corações ardiam de gratidão, pois enfim havíamos cruzado a Porta da Misericórdia das celas dos presidiários no Ano Santo do Senhor.
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Por, Pe. Claudemar Silva
Assessor de Comunicação da Diocese de Uberlândia